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O que é necessário que o ‘Acordo Florestal’ da COP26 entregue às pessoas e ao planeta

Uma criança carrega grãos de palma coletados do solo ao longo de um riacho em uma plantação de óleo de palmeira na Sumatra, Indonésia, novembro de 2017. © 2017 Binsar Bakkara / AP Photo  © 2017 Binsar Bakkara / AP Photo 

Era esperado que o Reino Unido e a Indonésia anunciassem hoje, 2 de novembro, na cúpula global sobre mudança climática, um “Acordo Florestal” visando encerrar e reverter o desmatamento até 2030. 

Se esse acordo é motivo para comemoração, dependerá de quem o subscreverá, de quão ambiciosos são seus objetivos, se coloca os direitos humanos como pilar para a preservação das florestas, como são seus mecanismos de responsabilização e se sinaliza maiores ambições em relação às iniciativas anteriores. 

O desmatamento é a segunda maior fonte de emissões de gases de efeito estufa, depois da queima de combustíveis fósseis. Hoje, o principal motor do desmatamento é a agricultura industrial, e a maior parte do desmatamento é considerada ilegal. 

Preservar as florestas é fundamental para permitir que esses ecossistemas continuem desempenhando sua função como esponjas que absorvem e armazenam carbono, regulam os padrões climáticos e fornecem o sustento de milhões de pessoas. 

Este acordo segue meses de negociações opacas presididas pelo Reino Unido e Indonésia no âmbito do Diálogo de Florestas, Agricultura e Comércio de Commodities (FACT, sigla em inglês para Forest, Agriculture and Commodity Trade) que começou em fevereiro. O objetivo era reunir os maiores produtores e consumidores mundiais de commodities agrícolas, impulsionadoras do desmatamento global. A sociedade civil foi convidada a fornecer contribuições por meio de consultas regionais, mas sem interação direta com autoridades públicas. 

Não está claro quem participou das negociações, exceto por uma lista de 25 países que endossaram uma declaração conjunta sobre “princípios de colaboração”, lançada em maio e atualizada em julho para adicionar a Alemanha. 

Outros endossos vieram do Brasil e da Indonésia, os maiores exportadores mundiais de soja, gado e óleo de palma. Na lista também estavam a Costa do Marfim e Gana, os países da África Ocidental que produzem mais da metade dos grãos de cacau do mundo. 

Um acordo anterior, adotado em 2014, a Declaração de Nova York sobre Florestas, também prometeu reduzir pela metade o desmatamento global até 2020 e encerrá-lo até 2030. Uma avaliação oficial de 2019 descobriu que havia "poucas evidências" de que os signatários estavam no caminho para cumprir suas metas. 

Em 2015, vários países europeus reunidos na Amsterdam Declarations Partnership disseram que queriam incentivar as “commodities sustentáveis e sem desmatamento” e pretendiam estimular as empresas a cumprirem seus objetivos de cadeias de produção com desmatamento zero, em particular para o óleo de palma. O progresso na implementação é aparentemente limitado, uma vez que a agricultura industrial continua sendo a principal causa do desmatamento. 

Além de presidir o Diálogo FACT, o Reino Unido é signatário de ambas as iniciativas. Em um esforço para mostrar liderança na COP26, o governo de Boris Johnson também apresentou um projeto de lei que poderia restringir a importação de commodities agrícolas provenientes do desmatamento ilegal, que o parlamento aprovou recentemente. 

O escopo e a eficácia do projeto de lei ainda não foram determinados pelos regulamentos que o executivo adotará, e que decidirão sobre as commodities cobertas pela lei, o tamanho das empresas às quais a lei se aplica e se exigirão que as empresas respeitem os direitos originários sobre a terra dos povos indígenas, que têm sido repetidamente esmagados pelo agronegócio. 

O que o acordo precisa incluir para causar impacto? 

Em termos de participantes, é fundamental incluir a China, cujas importações geram sozinhas 24 por cento do desmatamento tropical global vinculado ao comércio internacional, segundo estudo do WWF, com base em dados compilados pelo Stockholm Environment Institute (SEI). 

São notáveis os rumores sobre a assinatura do Brasil em referido acordo, tendo em vista o histórico ambiental desastroso do governo do presidente Jair Bolsonaro, que defendeu abertamente o garimpo, madeireiros e outros grupos que exploram ilegalmente os vastos recursos da floresta amazônica. O Brasil seria um participante importante, detendo 12 por cento dos recursos florestais do mundo, perdendo apenas para a Rússia. Entretanto, é difícil acreditar nas promessas do governo brasileiro, dados seus esforços até aqui para sabotar a fiscalização ambiental. 

Além de garantir os signatários relevantes, o acordo também deveria centrar em direitos humanos e, em particular, promover os direitos dos povos indígenas às suas terras. 

Em vários países, as taxas de desmatamento em territórios de povos indígenas e comunidades locais são mais baixas. Na Bolívia, a taxa de desmatamento em terras mantidas com segurança por povos indígenas é cerca de 35 por cento do que é em outras áreas comparáveis, no Brasil é de 40 por cento e na Colômbia a metade. Estudos na Ásia e na África sugerem que o fortalecimento da proteção dos direitos das comunidades à terra também leva à regeneração de florestas degradadas. Qualquer acordo sobre preservação florestal precisa reconhecer essa evidência e comprometer recursos para o avanço de direitos. 

O acordo deve sinalizar apoio às leis que restringem as importações ligadas ao desmatamento e abusos dos direitos humanos, que seriam executáveis e poderiam gerar progresso e fornecer um incentivo comercial para cadeias produtitvas sustentáveis. 

Finalmente, o Acordo Florestal deve se comprometer com metas que são mais ambiciosas, ao invés de simplesmente duplicar promessas anteriores para acabar com o desmatamento até 2030. Isso poderia incluir o compromisso dos participantes com metas concretas de curto e longo prazo para reduzir o desmatamento, decretando e aplicando moratórias sobre desmatamento de florestas primárias; promover a titulação e demarcação de territórios indígenas e promulgar estruturas legais para promover esses direitos em países que não o fizeram; e investigar e processar a violência e intimidação contra os defensores da floresta. 

 

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