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Américas: Abusos contra Migrantes no Estreito de Darién

A falta de rotas seguras e legais põe vidas em risco e fortalece o crime organizado

Migrantes e solicitantes de refúgio  embarcam em navegações que os levam de Necoclí a Capurganá, na Colômbia, onde muitos iniciam uma jornada de vários dias através do Estreito de Darién. © 2022 Human Rights Watch
  • As restrições de movimento, muitas vezes promovidas pelos Estados Unidos, têm pressionado migrantes e solicitantes de refúgio a atravessar o Estreito de Darién, expondo-os a abusos e fortalecendo o crime organizado.
  • As devastadoras histórias das pessoas que atravessam o Estreito de Darién são o resultado de políticas migratórias falhas que colocam as pessoas em perigo.
  • Os governos nas Américas deveriam tomar medidas para garantir políticas de migração que respeitem os direitos humanos, incluindo a ampliação de rotas seguras e legais para migração e garantindo acesso ao refúgio.

(Washington D.C.) - Restrições de movimento impostas por governos nas Américas têm levado migrantes e solicitantes de refúgio a arriscarem suas vidas atravessando o Estreito de Darién, uma selva pantanosa na fronteira entre a Colômbia e o Panamá, disse a Human Rights Watch em um relatório divulgado hoje.

O relatório de 62 páginas, “‘Este Inferno Foi Minha Única Opção’: Abusos contra Migrantes e Solicitantes de Refúgio Pressionados a Cruzar o Estreito de Darién”, é o primeiro de uma série de relatórios da Human Rights Watch sobre migração através do Estreito de Darién. A Human Rights Watch descobriu que restrições de movimento de países sul-americanos para o México e América Central, frequentemente promovidas pelo governo dos Estados Unidos, têm contribuído para um acentuado aumento no número de pessoas cruzando o Estreito de Darién. Isso as expõe a abusos, incluindo violência sexual, e fortalece o crime organizado na área.

“As devastadoras histórias que ouvimos no Estreito de Darién são resultado de políticas migratórias falhas que empurram as pessoas para uma selva onde estão expostas a todo tipo de perigo,” disse Juanita Goebertus, diretora para as Américas da Human Rights Watch. “Os crescentes desafios migratórios em nossa região exigem novas políticas de alcance regional que garantam os direitos das pessoas em movimento”.

No último ano, mais de meio milhão de pessoas cruzaram o Estreito de Darién em sua jornada ao norte, muitas vezes rumo aos Estados Unidos, fugindo de crises de direitos humanos nas Américas, incluindo violência e perseguição, e escapando da pobreza. Venezuelanos, haitianos e equatorianos, bem como pessoas de outras regiões como Ásia e África, arriscam suas vidas neste difícil terreno.

Desde janeiro de 2022, mais de 440.000 venezuelanos cruzaram o Estreito de Darién — o maior número entre todas as nacionalidades. Eles fogem de uma grave emergência humanitária, que tem limitado o acesso a alimentos e medicamentos, bem como de abusos e perseguições por forças de segurança, grupos armados e grupos criminosos.

A Human Rights Watch visitou o Estreito de Darién quatro vezes entre abril de 2022 e junho de 2023 e entrevistou quase 300 pessoas a fim de documentar as causas e respostas a esta crise. Entre os entrevistados estavam migrantes e solicitantes de refúgio que tinham cruzado ou estavam prestes a cruzar o Darién, vítimas de graves abusos de direitos humanos, trabalhadores humanitários, autoridades colombianas e panamenhas e especialistas em migração de toda a região. Os pesquisadores também analisaram dados e relatórios dos governos colombiano, panamenho e dos EUA; agências da ONU; organizações humanitárias e de direitos humanos locais, regionais e internacionais; e clínicas jurídicas locais.

A Human Rights Watch descobriu que os requisitos de visto impostos pelos governos do México e da América Central contribuem para o aumento de migrantes cruzando o Estreito de Darién. Após a imposição de requisitos de visto por alguns desses países para venezuelanos e equatorianos em 2021 e 2022, o número de pessoas de ambas as nacionalidades cruzando o Estreito de Darién disparou, sugerindo uma relação de causa e efeito.

Durante a caminhada de vários dias pelo estreito, migrantes e solicitantes de refúgio de todas as nacionalidades frequentemente são vítimas de roubo e graves abusos, incluindo violência sexual.

No lado colombiano do Estreito de Darién, o Clã do Golfo — um grupo armado envolvido no tráfico de drogas — regula as rotas que migrantes e solicitantes de refúgio podem usar, decide quem pode ajudá-los no caminho, extorque pessoas que se beneficiam dos fluxos de migrantes e estabelece regras de conduta tanto para a população local quanto para migrantes, por vezes, aplicando essas regras através da violência. O exército colombiano estima que o Clã coleta, em média, US$125 por pessoa que cruza o Estreito de Darién. Se a estimativa estiver correta, o grupo armado pode ter acumulado um total de US$57 milhões entre janeiro e outubro de 2023 a partir de seu controle sobre esta rota migratória.

Criminosos cometem abusos contra migrantes e solicitantes de refúgio à medida que cruzam as diversas rotas pela selva, especialmente do lado panamenho. As pessoas são rotineiramente roubadas, abusadas sexualmente e, às vezes, estupradas. A organização Médicos sem Fronteiras– (MSF) ajudou 950 pessoas, a maioria mulheres, que relataram terem sofrido violência sexual ao cruzar o Estreito de Darién desde abril de 2021.

Em maio de 2022, homens armados emboscaram um grupo de migrantes, incluindo uma haitiana de 22 anos que viajava com seu marido e filho de 1 ano. Os homens a separaram, juntamente com outras duas mulheres do grupo. Um homem a empurrou contra uma árvore e a agrediu sexualmente, contou ela. Um segundo homem juntou-se à agressão, perguntando onde estava o dinheiro. Ela apontou para suas botas. Eles pegaram todo o dinheiro que ela tinha guardado ali e a deixaram ir.

Com base na Declaração de Los Angeles sobre Migração e Proteção, assinada em 2022 por 21 países da região, os governos nas Américas deveriam implementar políticas migratórias que respeitem os direitos humanos. Deveriam também aproveitar o Fórum Global sobre Refugiados em dezembro de 2023 e a proximidade do  40º aniversário da Declaração de Cartagena de 1984 — um marco internacional sobre os direitos dos refugiados na América Latina — para responder aos crescentes desafios migratórios na região.

Os governos deveriam estabelecer um sistema temporário de proteção, em toda a região, que conceda a todos os venezuelanos e haitianos um status legal por um período razoável e renovável, e garantir que suas exigências de visto não impeçam efetivamente o acesso ao refúgio e pressionem as pessoas a recorrerem a travessias perigosas, incluindo o Estreito de Darién, disse a Human Rights Watch.

Os governos também deveriam agir para criar um mecanismo regional, equitativo e focado  em direitos humanos, para determinar a responsabilidade dos países em examinar as solicitações de refúgio e proteger refugiados. Esse mecanismo deveria considerar, na medida do possível, fatores individuais, como vínculos sociais ou familiares e escolhas individuais dos solicitantes. Os governos deveriam distribuir os custos de maneira equitativa e oferecer incentivos aos Estados membros para compartilhar responsabilidades, disse a Human Rights Watch.

“Os migrantes e solicitantes de refúgio têm o direito de movimentarem-se de forma segura e digna”, disse Goebertus. “Todos têm direito à condições básicas de segurança e ao respeito por seus direitos humanos durante sua jornada.”

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